Nota Técnica: COVID-19 e impactos sobre o Mercado de Trabalho na Região Metropolitana de Campinas / Março de 2020

PROFESSOR EXTENSIONISTA

Profa. Dra. Eliane Navarro Rosandiski

I – O CONTEXTO

Para compreender o impacto da pandemia do novo coronavírus (COVID-19) sobre a Região Metropolitana de Campinas (RMC), algumas questões devem ser levantadas. Tais questões estão associadas à inevitável crise que irá se abater sobre a economia brasileira duplamente determinada: (i) pelo aprofundamento da recessão mundial; e (ii) pelas medidas internas preventivas para reduzir o contágio.

Do ponto de vista externo, a epidemia, que começou em novembro na China, interrompeu alguns fluxos de comércio internacional, tanto de exportação como de importação. Em seguida, quando a epidemia já parecia mais controlada na China, a Europa se tornou o epicentro, em especial a Itália, Reino Unido e França. Também os Estados Unidos passaram a apresentar alto índice de contágio pelo vírus.

Figura 1 – Mapa de avanço da COVID-19, 2020

Fonte: https://www.msn.com/pt-br/noticias/ciencia-e-tecnologia/microsoft-lança-mapa-interativo-que-acompanha-o-avanço-do-covid-19-no-mundo/ar-BB11iVRM

Esse fato levou a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 11 de março de 2020, a decretar a pandemia de COVID-19, como um alerta para a adoção de ações, em todos os países, para conter a disseminação da doença e para cuidar dos pacientes adequadamente.

Além da confirmação de casos no país, o alerta internacional com relação aos níveis de disseminação, bem como a observação dos efeitos das medidas adotadas nos países afetados pelo vírus para conter a sua propagação foram determinantes para que o Ministério da Saúde brasileiro decretasse Estado de Emergência, de Calamidade Pública e de Exceção, a fim de que entraves/limites orçamentários possam ser retirados, visando preparar o sistema de saúde para atender os possíveis infectados e também para contrabalançar os efeitos econômicos dessa crise iminente.

Figura 2 – Como retardar o contágio

Fonte: https://g1.globo.com/mundo/blog/helio-gurovitz/post/2020/03/12/um-grafico-explica-a-pandemia.ghtml

Devido ao elevado grau de contágio da COVID-19 e como forma de conter a disseminação, medidas que estimulam o isolamento social foram fortemente recomendadas pelos especialistas na área de saúde, visando reduzir as aglomerações e proteger a população. Tais medidas têm impactos diretos sobre a saúde, a vida social e atividade econômica. Do ponto de vista econômico, os efeitos são imprevisíveis. A queda de demanda decorrente da quarentena afetará diretamente setores de serviços e comércio, atingindo, como um efeito dominó, toda a atividade econômica.

Ainda com relação ao panorama nacional geral, cabem algumas considerações com relação às alterações constitucionais, anteriores à pandemia, que visavam criar um ambiente para retomada do nível de atividade, após fortes quedas seguidas no PIB nacional:

  • em 2017 foi aprovada a lei 13.467 que buscava flexibilizar as leis de contratação de trabalhadores;
  • em outubro de 2018, foi aprovada a Emenda Constitucional 95 (EC95) que visava conter os gastos sociais por 20 ano; e
  • em 2019 foi aprovada Emenda Constitucional 103 (EC103) da Reforma da Previdência.

No entanto, tais reformas não trouxeram os efeitos esperados, ao contrário:

  • o PIB praticamente não se recuperou, expandindo, em 2019, apenas 1,1%;
  • o desemprego continuou em torno de 11%;
  • o crescimento do emprego foi puxado pele subemprego e pelas vagas informais, segundo o IBGE, de modo que cerca de 40% dos ocupados, no início de 2020, eram informais; e
  • por fim, o setor de saúde público, em razão do teto de gastos, não conseguiu fazer os investimentos necessários.

E foi justamente nesse contexto, somado ao quadro de desvalorização da moeda[1] e de queda do preço internacional do petróleo[2], que, em março de 2020, o Brasil iniciou suas ações para evitar a disseminação da COVID-19.

Ou seja, esta pandemia chega ao Brasil numa situação econômica já frágil e incerta, com baixos sinais de recuperação, entre outros fatores decorrentes da crise já instalada no cenário internacional.

Mesmo ainda num cenário de muita incerteza e de indefinições quanto às políticas adotadas, é necessário fazer um breve retrato da situação atual do mercado de trabalho, entender suas vulnerabilidades e quais as demandas para que os impactos negativos sejam minimizados, sobretudo para os mais vulneráveis.

Diante disso, cabe avaliar os possíveis impactos dessas medidas sobre a Região Metropolitana de Campinas (RMC), ou pelo menos mensurar os grupos mais vulneráveis.

II – ESTIMATIVAS DE AGREGADOS POPULACIONAIS EM CAMPINAS

Os quadros 1 e 2 que seguem foram elaborados a partir dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios-Trimestral do IBGE. As estimativas para a Região Metropolitana de Campinas tomam como referência a estrutura do mercado de trabalho do Estado de São Paulo.

Estima-se que o número de residentes seja de 3,2 milhões de pessoas das quais 1,5 milhão tem menos de 15 anos.

Dessa forma, a População em Idade Ativa (PIA) é cerca de 2,7 milhões de pessoas, das quais 2/3 participam do mercado de trabalho, seja como ocupado, seja como desempregado. No entanto, este 1/3 da PIA já esconde uma situação dramática: estima-se que 61 mil pessoas estejam desalentadas, o que significa que deixaram de procurar emprego por falta de dinheiro ou mesmo por falta de iniciativa.

A população efetivamente desempregada pode ser estimada em 209,9 mil indivíduos e representa 11% da População Economicamente Ativa (PEA).

No entanto, estimar que 89% da PEA está ocupada não significa que tenha uma situação regular no mercado de trabalho. Ao contrário, estima-se que 450,6 mil não contribuem para a previdência, além de que 379,2 mil estão subocupadas.

Quadro 1 – Estimativas de agregados populacionais para a RMC em 2019

  Estimativa
População Residente     3.264.915
Pop. acima de 15 anos (PIA)     2.713.377
Taxa de Participação (*) 67%
Taxa de Ocupação (**) 89%
   
População Desalentada          61.865
População Desempregada        209.963
População Subocupada        379.256
Pop. ocupada que não contribui para a previdência        450.642

Fonte: IBGE – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua trimestral e Contagem Populacional

(*)  (PO + Desempregados)/PIA

(**) Ocupados/PEA

Dentre os que não contribuem para a Previdência, observa-se que, em sua maioria, são profissionais por conta própria e empregados sem carteira de trabalho assinada.

Por fim, estima-se que 109,3 pessoas estejam inseridas em atividades de serviços domésticos.

Quadro 2 – Distribuição da estimativa da população ocupada que não contribui para a Previdência e Emprego Doméstico na RMC em 2019

  Distribuição
Pop. ocupada que não contribui para a Previdência        450.642
   Conta Própria sem CNPJ 53%
   Empregador sem CNPJ 2%
   Empregados sem carteira 41%
Serviço doméstico        109.354

Fonte: IBGE – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua trimestral.

Esta estimativa já fornece um quadro da situação de fragilidade do mercado de trabalho regional, visto que cerca de 559 mil pessoas exercem trabalho informal, somando-se aos 270 mil desempregados e desalentados. 

III – MERCADO DE TRABALHO FORMAL

Quanto à situação do mercado de trabalho formal, mensurada a partir das informações da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) e Cadastro Geral de Empregados e Desligados (CAGED), divulgadas pelo Ministério da Economia, estima-se que, com a geração do saldo de 9.967 novos postos, em dezembro de 2019, a RMC apresentava um estoque de 988.115 trabalhadores formais.

Com relação ao saldo de 2019, chama atenção o protagonismo das empresas com até 4 empregados. Este segmento de empresas foi responsável pela criação de 16,9 mil postos de trabalho, compensando a relativa estagnação e queda em empresas de maior porte.

Gráfico 1 – Saldo de emprego na Região Metropolitana de Campinas, 2018 e 2019

Fonte: CAGED, Secretaria de Trabalho/Ministério da Economia, 2020.

Gráfico 2 – Emprego por tamanho de Estabelecimento na Região Metropolitana de Campinas, 2018

Fonte: RAIS, Secretaria de Trabalho/Ministério da Economia, 2020.

O gráfico 2 mostra que as microempresas, em 2018, eram responsáveis por 8% do estoque de emprego formal, o que significa cerca de 76,4 mil postos de trabalho.

O gráfico 3 complementa as informações estruturais e revela que 84% desses trabalhadores foram inseridos em empresas com até 4 empregados nos setores de comércio e serviços. Esse percentual é maior que o observado para o total do mercado de trabalho, em que as atividades de comércio (21%) e serviços (41%) são responsáveis juntas pela geração de 62% dos postos de trabalho.

Gráfico 3 – Distribuição do Emprego Setorial total e nos Estabelecimentos com até 4 empregados na Região Metropolitana de Campinas, 2018

Fonte: RAIS, Secretaria de Trabalho/Ministério da Economia, 2020.

Por fim, o Gráfico 4 mostra a importância dos setores de comércio e serviços na dinâmica do emprego gerado em 2019.

Gráfico 4 – Saldo do Emprego Setorial total e nos Estabelecimentos com até 4 empregados na Região Metropolitana de Campinas, 2018

Fonte: CAGED, Secretaria de Trabalho/Ministério da Economia, 2020.

Do total de 9,9 mil novos postos de trabalho, foram gerados 4 mil no comércio e 5,3 mil nos serviços.

Quando feito o corte por tamanho de empresa, percebe-se que de 16,9 mil empregos, 6 mil foi no comércio e 7 mil nos serviços e, apesar do saldo negativo no total da indústria de transformação, as microempresas geraram 1,8 mil novos postos industriais.

Essas primeiras informações mostram que a criação de emprego na RMC teve como dinâmica os segmentos que compõem as atividades terciárias e as pequenas empresas, de até 4 empregados.

Quadro 3 – Distribuição do saldo de emprego por setor e tamanho de empresa (até 4 empregados) na RMC em 2019

IBGE Subsetor ATÉ 4 Total
01-Extrativa mineral 0% 0%
02-Indústria de produtos minerais não metálicos 1% -1%
03-Indústria metalúrgica 1% 1%
04-Indústria mecânica 3% 3%
05-Indústria do material elétrico e de comunicações 1% -3%
06-Indústria do material de transporte 0% -9%
07-Indústria da madeira e do mobiliário 1% -2%
08-Indústria do papel, papelão, editorial e gráfica 0% -5%
09-Ind. da borracha, fumo, couros, peles, similares, ind. diversas 0% 3%
10-Ind. química de produtos farmacêuticos, veterinários, perfumaria 1% 6%
11-Indústria têxtil do vestuário e artefatos de tecidos 1% -6%
12-Indústria de calçados 0% 1%
13-Indústria de produtos alimentícios, bebidas e álcool etílico 2% -7%
14-Serviços industriais de utilidade pública 0% 7%
15-Construçao civil 10% 18%
16-Comércio varejista 31% 32%
17-Comércio atacadista 4% 9%
18-Instituições de crédito, seguros e capitalização 0% -2%
19-Com. e administração de imóveis, valores mobiliários, serv. técnico 20% 22%
20-Transportes e comunicações 4% 16%
21-Serv. de alojamento, alimentação, reparação, manutenção, redação 11% 8%
22-Serviços médicos, odontológicos e veterinários 2% 2%
23-Ensino 3% 8%
24-Administração pública direta e autárquica 0% -2%
25-Agricultura, silvicultura, criação de animais, extrativismo vegetal… 1% 2%
Total 100% 100%

Fonte: CAGED, Secretaria de Trabalho/Ministério da Economia, 2020.

O quadro 3 mostra que 1/3 do saldo de emprego nas empresas de 1 a 4 empregados foi gerado no setor de comércio, 20% nos serviços de administração e 11% nos serviços de alojamento e alimentação.

Quadro 4 – Distribuição do emprego gerado pelas empresas com até 4 empregados, RMC, 2019

COMÉRCIO 85% do emprego gerado:  
Comércio Varejista Não Especializado 27%
Comércio Varejista de Produtos Novos Não Especificados Anteriormente e de Produtos Usados 15%
Comércio Varejista de Produtos Alimentícios, Bebidas e Fumo 9%
Comércio Varejista de Equipamentos de Informática e Comunicação 9%
Comércio Varejista de Produtos Farmacêuticos, Perfumaria e Cosméticos, e Artigos Médicos, Ópticos e Ortopédicos 7%
Comércio de Peças e Acessórios para Veículos Automotores 5%
Comércio Varejista de Material de Construção 5%
Comércio Atacadista Especializado em Produtos Alimentícios, Bebidas e Fumo 3%
Comércio Atacadista Especializado em Outros Produtos 3%
SERVIÇOS 85% do emprego gerado:  
Restaurantes e Outros Serviços de Alimentação e Bebidas 25%
Transporte Rodoviário de Carga 8%
Serviços de Escritório e Apoio Administrativo 7%
Outras Atividades de Serviços Prestados Principalmente às Empresas 6%
Atividades dos Serviços de Tecnologia da Informação 6%
Educação Infantil e Ensino Fundamental 5%
Outras Atividades de Ensino 4%
Outras Atividades de Serviços Pessoais 4%
Atividades de Atenção Ambulatorial Executadas por Médicos e Odontólogos 3%
Serviços de Arquitetura e Engenharia, e Atividades Técnicas Relacionadas 3%
Serviços Combinados para Apoio a Edifícios 2%
Atividades Esportivas 2%
Aluguel de Máquinas e Equipamentos sem Operador 2%
Atividades de Limpeza 2%
Atividades Relacionadas à Organização do Transporte de Carga 2%
Atividades de Assistência a Idosos, a Deficientes Físicos, a Imunodeprimidos e a Convalescentes 2%

Fonte: CAGED, Secretaria de Trabalho/Ministério da Economia, 2020.

O quadro 4 informa que as atividades de comércio e serviços alimentares tiveram forte participação na geração de emprego nas empresas com até 4 empregados.

Diante disso, pode-se concluir, com relação aos dados estruturais do mercado de trabalho formal, que:

  1. os setores de serviço e comércio apresentaram maior dinamismo na geração de emprego formal, representando 62% do emprego total da RMC;
  2. a indústria de transformação representa 25% do total de emprego na RMC;
  3. as empresas com até 4 empregados, apesar de participarem com apenas 8% da estrutura formal, foram as que apresentaram dinamismo na geração de vagas em 2019.

IV – CONCLUSÕES/PONTOS PARA DEBATER

A crise sanitária mundial, deflagrada pela disseminação da COVID-19, provavelmente irá impactar fortemente o mercado de trabalho mundial.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que a queda da demanda provocará o crescimento do desemprego mundial na ordem de 5,3 a 25 milhões de pessoas, com o trabalho informal sendo o mais atingido.  Assim, no intuito de atenuar os níveis dessa projeção, a entidade recomenda uma resposta coordenada internacional, ou seja, os governos devem adotar medidas em três pilares: proteger os trabalhadores no local de trabalho; estimular a economia e o emprego; e assegurar emprego e renda.

No Brasil, algumas medidas já foram anunciadas, por meio de Medidas Provisórias (MP) que provavelmente serão aprovadas pelo Congresso Nacional, após promulgação do decreto de Calamidade Pública, e sinalizam para as ações que visam destinar mais de R$ 169,6 bilhões para combater os efeitos econômicos do avanço da COVID-19, entre elas:

  1. Criação de um auxílio emergencial de R$ 600,00 para indivíduos, com mais de 18 anos, que integrem família de baixa renda. Este benefício não poderia ser acumulado com outros, como benefício previdenciário, BPC, Bolsa Família e seguro-desemprego [3]. Estima-se que de 15 a 20 milhões de pessoas seriam contempladas com este benefício.
  2. Antecipação de metade do 13º salário a aposentados e pensionistas, cujas parcelas serão pagas ainda no primeiro semestre.
  3. Medidas temporárias para manutenção do emprego, tais como simplificação das regras para trabalho remoto, antecipação de férias individuais e feriados não religiosos, decretação de férias coletivas, uso de banco de horas, além de redução proporcional de salários e jornada de trabalho. Ressalta-se que essas medidas passam pela validação de acordo entre trabalhador e empregador após negociações individuais que poderão se sobrepor à lei, respeitados os limites da Constituição. Além disso, no que tange à redução de salário, caso haja concordância entre empresa e funcionário, será permitido um corte de até 50%, com redução proporcional da carga horária, desde que não resulte em remuneração menor do que um salário mínimo.
  4. Adiamento do recolhimento de FGTS pelos empregadores durante o período de estado de emergência.
  5. Aprovação de medidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para facilitar a renegociação de dívidas de empresas e famílias consideradas boas pagadoras. Famílias e micro e pequenas empresas que estão com os pagamentos em dia poderão pagar a próxima parcela da dívida só daqui a 60 dias.
  6. Adiamento do pagamento de tributos do Simples Nacional por comitê, formado por representantes da Receita, de estados e municípios, durante três meses.

A despeito desse esforço, é importante ter clareza de que a crise será de longa duração.

Alguns analistas preveem, possivelmente, uma parada quase total do mundo, que resultará em uma queda do PIB global em 2020. Por esse motivo, advoga-se a necessidade de adotar políticas fiscais extraordinárias e robustas para atenuar os efeitos da crise. Diante disso, para atenuar o risco de depressão, metas fiscais e a evolução da dívida tornam-se absolutamente irrelevantes.

Como visto, antes da chegada da pandemia, a economia nacional já se revelava vulnerável, visto que, conforme dados do IBGE, a recuperação do emprego nacional foi puxada pela informalidade, representando cerca de 40% da população ocupada.

Mesmo não sendo específicos para a RMC, pode-se, a partir dos dados da PNAD/IBGE, estimar que 559 mil pessoas ocupadas trabalham sem contrato de trabalho e proteção trabalhista, e 109 mil estão no emprego doméstico. No mercado de trabalho formal, os segmentos mais dinâmicos, nos dois últimos anos, foram comércio e serviço, em empresas de 1 a 4 empregados.

Este quadro de informalidade é preocupante, bem como este padrão de recuperação do emprego formal, pois, na hipótese de prolongamento da queda de demanda, estes prestadores de serviços/comerciantes provavelmente não terão acesso à complementação emergencial.

Por fim, cabe uma consideração sobre o impacto da crise sobre o emprego nas atividades industriais, que representa 25% do mercado de trabalho da RMC. Trabalhadores estão em férias coletivas por causa da queda das importações de componentes eletroeletrônicos vindos da China e/ou Europa e sofrerão menor impacto. Se ocorrer algum ajuste, serão em ocupações mais fáceis de serem substituídas, em geral naquelas que exigem menor qualificação.

Porém, o maior risco é um prolongamento da queda das exportações somado à contração do mercado interno. Quando a indústria perde demanda e decide interromper definitivamente os fluxos de produção, uma parte dos serviços especializados perde demanda também. Neste caso, os efeitos serão sentidos com mais intensidade pelo mercado formal de trabalho como um todo, afetando os segmentos mais especializados do setor terciário.

Apesar de o Ministério da Economia estimar empregar R$ 169 bilhões em medidas emergenciais para socorrer grupos de cidadãos mais vulneráveis, tais medidas podem ser consideradas tímidas diante do tamanho da crise, visto que são insuficientes para reverter o seu quadro.

A tentativa de socorro direto às empresas endividadas, via renúncia fiscal e alongamento do prazo de pagamento das dívidas, pode ajudar a resolver parte do problema das empresas de menor porte, que é o capital de giro.

Medidas de contenção de salários não são recomendadas, visto que retardarão a retomada do ciclo.

No entanto, o debate sobre o papel da política fiscal na defesa da sociedade diante da crise deve ser revisto. A queda de demanda, em razão das medidas de isolamento social, tem efeitos devastadores sobre os pequenos empreendedores. Neste caso, defende-se a adoção de medidas de transferência direta de renda para evitar a falência desses pequenos produtores, tal como vem sendo anunciada na Alemanha, França e Estados Unidos.

Conclui-se que, na RMC, junto com as atividades industriais, o setor terciário – especialmente no que se refere a pequenos comércios e serviços de alojamento e alimentação, serviços pessoais (academias, salões de beleza, manutenção), serviços relacionados à arte, cultura e recreação, serviços domésticos – sofrerá muito com a queda de demanda.

E, como os dados mostraram, o saldo do emprego formal em 2019 foi puxado pelas pequenas empresas que estruturalmente se situam nestes setores terciários. Por suas características, essas pequenas empresas têm pouca capacidade financeira para suportar uma redução de demanda. Infelizmente, se a quarentena perdurar, parte do emprego formal gerado em 2019 será destruído.

V.  Sites consultados:

http://pdet.mte.gov.br/acesso-online-as-bases-de-dados

https://sidra.ibge.gov.br/home/abate/brasil

https://valor.globo.com/mundo/noticia/2020/03/18/coronavrus-25-milhes-podem-ficar-sem-emprego-diz-oit.ghtml

https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/03/18/trabalhadores-informais-receberao-ajuda-de-r-200-por-mes-diz-guedes.ghtml

https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2020/03/18/internas_economia,835143/coronavirus-medida-do-governo-permitira-corte-de-salario-de-trabalhad.shtml

https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/03/19/coronavirus-o-que-muda-com-a-pandemia.htm

https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/03/16/medidas-economicas-para-combater-coronavirus-ajudam-mas-sao-insuficientes-dizem-analistas.ghtml


[1] A desvalorização do real está associada à saída de capital financeiro externo do país, depois que o COPOM optou pela trajetória de rebaixamento da taxa de remuneração dos títulos públicos (taxa SELIC).

[2] A queda do preço internacional do petróleo já é um efeito do excesso de oferta decorrente da queda de demanda chinesa pelo óleo.

[3] Há, atualmente, cerca de 29 milhões de famílias na lista, mas nem todas recebem benefícios, como Bolsa Família e BPC (auxílios assistenciais a idosos e deficientes), por apresentarem renda acima dos critérios de pobreza ou extrema pobreza.

O Bolsa Família atende famílias com filhos de 0 a 17 anos, que vivem em situação de extrema pobreza, com renda per capita de até R$ 89 mensais, e pobreza, com renda entre R$ 89,01 e R$ 178 por mês. O benefício médio é de R$ 191.


Profa. Dra. Eliane Navarro Rosandiski

Possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Estadual de Campinas (1992), mestrado em Política Científica e Tecnológica pela Universidade Estadual de Campinas (1996) e doutorado em Economia Aplicada pela Universidade Estadual de Campinas (2002).É professora-extensionista da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, com vínculo integral de 40 horas semanais. Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Economia dos Recursos Humanos, atuando principalmente nos seguintes temas: mercado de trabalho, política pública e economia solidária. (Fonte: Currículo Lattes)


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