Mapeamento da Vulnerabilidade no município de Campinas: dados exploratórios do CadÚnico

Mapeamento da Vulnerabilidade no município de Campinas: dados exploratórios do CadÚnico

PROFESSOR EXTENSIONISTA (PUC-Campinas):

Profa. Dra. Eliane Navarro Rosandiski

Discente: Ana Júlia Perreira

 

Apresentação

A proposta dessa nota é apresentar uma caracterização de cinco áreas no município de Campinas a partir do Cadastro Único. Essa caracterização seria um primeiro passo, ainda bem exploratório, na construção de um mapeamento acerca da vulnerabilidade social no território.

Vele dizer que, o tema da vulnerabilidade e, consequentemente a construção de um mapa da vulnerabilidade social se constituem num desafio, visto que sua conceituação multidimensional interfere diretamente na escolha das variáveis que serão elencadas para defini-la.

Simone Rocha da Rocha Pires Monteiro em seu artigo: O marco conceitual da vulnerabilidade social faz uma excelente revisão sobre o tema, que servirá de base para proposição metodológica. A autora propõe uma abordagem de enfretamento da vulnerabilidade que se estrutura a partir da noção de risco social, em contraposição às antigas abordagens que definiam a vulnerabilidade a partir de um critério meramente econômico, que geralmente se utilizava de indicadores de acesso ou de carências de satisfação das necessidades básicas. Rejeitar essa abordagem significa tirar o foco apenas no indivíduo e buscar compreender, e por isso incluir, os determinantes do processo de empobrecimento.

Nessa abordagem mais ampla, se o desenvolvimento metodológico para delinear/caracterizar os grupos de risco na sociedade requer a compreensão do contexto social que produziu a vulnerabilidade, torna-se imperativa a escolha de variáveis capazes de refletir esse contexto.

Monteiro (2011) oferece uma pista para enfrentar esse desafio metodológico: compreender a vulnerabilidade como uma exposição/predisposição aos riscos de diferentes naturezas – econômicos, culturais e sociais. Nas palavras da autora “vulnerabilidade social se constitui como um produto negativo da relação entre recursos simbólicos e materiais, de indivíduos ou grupos, e o acesso a oportunidades” (op.cit p33).

Isto permite considerar múltiplos condicionantes relacionados aos contextos, todos apontando para uma mesma direção: a ausência ou precarização de recursos materiais capazes de garantir a sobrevivência e a falta de acesso aos bens e serviços capazes de assegurar alguma mobilidade social.

Nesse caso, do ponto de vista metodológico tem-se que características básicas dos indivíduos necessariamente devem ser combinadas com as características territoriais (comunidade) para definir suas vantagens e/ou desvantagens sociais.

Seguindo a proposta de Monteiro (2011) há quatro aspectos/ativos que se articulam entre si. Os aspectos físicos relatam o meio de vida: moradia e acesso aos bens duráveis. Os ativos financeiros se relacionam ao acesso ao capital financeiro. Os aspectos humanos estariam atrelados à qualidade da força de trabalho: saúde e educação. E, por fim os ativos sociais seriam pautados em relações de confiança e reciprocidade.

Entendido dessa forma, a redução da vulnerabilidade social requer o planejamento de ações, públicas ou articuladas da sociedade civil, capazes de oferecer bens e serviços capazes de promover garantias de direitos, condições dignas de vida, emancipação e autonomia.

Considerando que compreender e mapear a vulnerabilidade social é o pressuposto para avaliar o alcance das políticas sociais e/ou ações privadas sejam elas proativas, protetivas preventivas e considerando que a atividade de extensão desenvolvida tem como objetivo específico democratizar o acesso aos indicadores que embasam as ações de atores sociais no território, estima-se que as informações sistematizadas sensibilizem a sociedade quanto à urgência do planejamento de ações estratégica.

O que o CADÚnico mostra sobre a vulnerabilidade em Campinas?

Em termos metodológicos os aspectos que se aglutinam e se sobrepõem para entender vulnerabilidade são o físico, o financeiro, o humano e social. Este eixo de construção requer um novo desafio: a escolha de variáveis e base de informações que permitam construir o mapeamento municipal.

O maior conjunto de informações que permitem mapear a realidade municipal é disponibilizado pelo Censo Demográfico (IBGE). No entanto, tais informações são decenais, durante esse intervalo há um apagão estatístico. Quanto mais intensas as mudanças conjunturais maiores as chances de defasagens nos diagnósticos acerca dos processos de empobrecimento e movimentações da população mais vulnerável no território.

Diante desse desafio surge uma possibilidade de utilizar as informações do CADÚnico. Essa base é um cadastro, gerenciado pela Secretaria Municipal de Assistência Social, que reúne um conjunto importante de informações socioeconômicas de indivíduos/famílias que necessitam de acessar algum tipo de serviço do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). O programa mais conhecido era o antigo Bolsa Família, porém os cadastrados se habilitam a diversos outros serviços, tais como programa Minha Casa minha Vida, Benefícios de Prestação Continuada, Água para todos, dentre outros.

Diante dos benefícios/serviços ofertados, pode-se inferir que o público que os demanda está em maior de condição de vulnerabilidade. Estima-se então que as características dessas famílias pertencentes ao CADÚnico podem ser uma proxy da vulnerabilidade no município.

Essa metodologia está em fase inicial e exploratória, porém alguns aspectos gerais podem embasar a construção do mapa da vulnerabilidade.

Nessa nota serão apresentadas algumas características dos aspectos físicos e econômicos da vulnerabilidade social.

Antes, porém cabe situar o município de Campinas na Região Metropolitana de Campinas.

 

Os dados gerais mostram que Campinas, com 1,2 milhões de habitantes corresponde a 37% da população da Região Metropolitana de Campinas (RMC), contudo, concentra metade da população em extrema pobreza, percentual mais alto se considerar a percentual de 53% de jovens de 18 a 24 anos. Também é preocupante, neste cenário geral o percentual de 58% de pessoas em situação de rua.

Com a finalidade de inferir os aspectos físicos da vulnerabilidade cabe mapear as condições de moradia dessas famílias.

As regiões Sudoeste e Sul concentram a metade as famílias. Na região Leste se concentra o menor percentual de famílias, apenas 11% e menor concentração de domicílios urbanos (84%) e maior de domicílios coletivos (9%) com menor média de cômodos.

As características específicas dos domicílios mostram maior concentração de domicílios com paredes sem revestimento, ausência de calçamento e acesso à iluminação sem medidores nas regiões sudoeste e sul.

Informações quanto ao acesso à água e o saneamento reforçam a vulnerabilidade dos domicílios situados na região sul, em especial nos quesitos de escoamento sanitário, em que 5% dos domicílios despejam diretamente no rio, lago. Este mesmo percentual (5%) nesse quesito também é observado na região noroeste, que, além disso, dentre as regiões urbanas apresenta o menor percentual (90%) dos domicílios com acesso à água canalizada. A região leste, talvez por ser a menos urbana, apresenta piores indicadores de acesso à água, rede de esgoto e existência de banheiro.

Por fim, a última característica diz respeito à coleta de lixo, observa-se que em regiões mais urbanas cerca de 90% do lixo é coletado diariamente e apenas na região leste esse percentual é menor, apenas 70%.

Pode-se concluir essa primeira parte apontando que as regiões sudeste e sul concentram maior parte dos domicílios. Além disso, nessas regiões os domicílios apresentam maiores características de vulnerabilidade, em que pese o acesso à água e saneamento. Condições fundamentais para prevenção e saúde dos indivíduos.

Seguem agora algumas informações acerca dos atributos financeiros dessa população.

Começando pela remuneração média, observa-se que o melhor padrão está na região Leste. As regiões sul e sudoeste, por sua elevada densidade populacional se aproxima da média observada em Campinas, que é fica em torno de R$ 330

Esta informação acerca do rendimento médio deve ser complementada por informações quanto à origem da renda. Um ponto que chama atenção é que em torno de 40% renda dos domicílios tem origem nas aposentadorias.

Ainda no tema do acesso aos recursos financeiros apontam que a maior mais da metade da renda dos domicílios vem da pessoa de referência, cerca de 30% do cônjuge, em seguida dos filhos (8%) e por fim em torno de 4% dos pais. Vale destacar que, entre regiões esse perfil não se altera de forma significativa.

Observa-se que quando se trata do acesso os recursos toda a família percebe-se a importância da renda do trabalho e de aposentadoria. No entanto, na composição das famílias chama atenção a presença de filhos, em especial nas regiões Sul e Noroeste, que nesse caso talvez explique a menor renda per capita dos domicílios.

Comentários

Essas informações ainda preliminares deverão ser complementadas com os aspectos relacionados às capacidades humanas disponíveis do CADÚnico. Nesse caso informações quanto ao perfil etário, educacional associados à forma de inserção no mercado de trabalho irão fornecer algumas pistas quanto à vulnerabilidade dos indivíduos que habitam nos territórios/regiões.

O aspecto social será o mais difícil de ser captado, visto que o cadastro não oferece informações que captam as relações de confiança e reciprocidade. Do ponto de vista metodológico é possível inferir a relação de proximidade/vizinhança a partir da área censitária. Nesse case caso poderá ser utilizada a hipótese que essa proximidade criaria o vínculo comunitário necessário para que tais grupos se tornem o alvo das ações promotoras de redução da vulnerabilidade.

Referência Bibliográfica

Monteiro, S.R.R.P. (2011) O marco conceitual da vulnerabilidade social in Sociedade em Debate, Pelotas, 17(2): 29-40, jul.-dez./2011.

 



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