Estudo Temático: Estrutura e Evolução da Produção e do Comércio Exterior da Região Metropolitana de Campinas, V.1, N. 1, 2018

PROFESSOR EXTENSIONISTA (PUC-Campinas):

Prof. Dr. Paulo Ricardo da Silva Oliveira

1. Introdução

A Região Metropolitana de Campinas (RMC) é um importante polo industrial do Estado de São Paulo, composta por 20 munícipios, onde vivem, atualmente, mais de 3,1 milhões de pessoas. Do ponto de vista da atividade econômica, a RMC é considerada uma das maiores regiões metropolitanas paulistas, ficando atrás, apenas, da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). Em 2015, a RMC atingiu o valor adicionado total (VAT) de 140,6 bilhões de reais, aproximadamente 8,65% do VAT do Estado de São Paulo.

Este Estudo Temático tem por objetivo caracterizar a estrutura e evolução das atividades produtivas e de comércio exterior da RMC, a partir da análise do valor agregado total (VAT), do Valor Adicionado Fiscal das atividades produtivas (VAF) e dos fluxos de comércio. Esta caracterização tem maior ênfase em fatores estruturais, de forma que mudanças conjunturais são consideradas em menor medida. A amplitude temporal do trabalho está limitada pela disponibilidade de dados oficiais publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pela Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda de São Paulo (Sefaz/SP). Os dados da balança comercial são disponibilizados com maior periodicidade pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC).   

Estudos sobre a estrutura e dinâmica da produção e da inserção internacional da RMC são importantes, já que o desenho eficiente de políticas de desenvolvimento socioeconômico requer, primeiramente, o amplo entendimento da realidade socioeconômica regional por parte dos formuladores de políticas. O melhor entendimento da estrutura produtiva da região também interessa aos demais agentes públicos e privados que são sempre afetados, ainda que indiretamente, pelo nível da atividade econômica e o padrão de inserção dos agentes produtivos locais nas cadeias globais de valor.  

Este estudo está dividido em quatro partes além desta introdução. Na primeira parte, apresentam-se e discutem-se a estrutura de produção do setor de serviço, indústria e agropecuária e sua evolução no tempo. Na segunda, analisam-se as principais atividades econômicas desenvolvidas no âmbito dos grandes setores, buscando qualificá-las de acordo com o grau de intensidade tecnológica. Na terceira, discute-se a estrutura de comércio exterior da região a partir da pauta de exportação e importação e dos principais parceiros comerciais. Por fim, resgatam-se os principais pontos do estudo e são tecidas as considerações finais.

2. Serviço, Indústria e Agropecuária na Região Metropolitana de Campinas

O objetivo desta seção é apresentar a estrutura produtiva da RMC e sua evolução partir do valor adicionado total (VAT) e do valor adicionado fiscal (VAF) entre os anos de 2000 e 2015[1].  Neste sentido, decompõe-se o VAT em valor adicionado da indústria, serviços e agropecuária, bem como analisa-se a evolução da composição setorial do mesmo. A fim de situar a representatividade da RMC em termos relativos, discute-se a participação relativa do VAT da RMC no VAT do Estado de São Paulo, inclusive as mudanças ocorridas nos anos considerados. Por fim, apresenta-se a participação dos municípios no VAT da RMC.

A composição setorial do VAT regional evidencia a predominância estrutural dos setores de serviço e da indústria, durante todo período considerado, como mostra o Gráfico 1.

Os dados mostram que o VAT da Região cresceu de forma significativa entre 2002-2015, a despeito de oscilações, sobretudo entre os anos de 2008 e 2012, os quais foram marcados pela crise financeira internacional de 2008. Entre 2002-2015, VAT cresceu a taxa de 3,67% a.a., sendo que o valor adicionado real foi de 87,95 bilhões, em 2012, e 140,62 bilhões, em 2015[2].

No entanto, nota-se que este crescimento se deu a diferentes taxas para os subperíodos. Entre 2002 e 2010, acompanhado o período de significativa expansão da economia nacional, a RMC cresceu de forma expressiva e relativamente continuada, a taxa média de 5,21% ao ano, enquanto o Estado de São Paulo cresceu a taxa anual de 4,25% no mesmo período – ver Tabela 1. Na história recente da Região, este foi o período de grande expansão da atividade econômica, puxada pelos investimentos significativos ocorridos na região em diversos setores da indústria e dos serviços. Os relatórios sobre os investimentos anunciados do período, disponibilizado pela Agência Metropolitana de Campinas (AGEMCAMP) organizado pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE), corroboram este fato, a partir da significativa expansão dos investimentos anunciados para Região, sobretudo entre os anos 2000 e 2005 – ver SEADE (2006; 2013)

Entre 2010 e 2012, período de retração da economia nacional, o VAT decresce a taxa de -2.05% ao ano, enquanto o Estado de São Paulo tem crescimento de 2,48%. Esse foi o pior período da história recente da RMC, que, em relação ao Estado de São Paulo, sentiu de forma mais aguda os impactos da crise financeira e econômica de 2008. Dado o caráter da crise econômica e financeira internacional, que atinge de forma significativa as grandes multinacionais da indústria de transformação, e natureza industrial da RMC, tais efeitos negativos no VAT eram esperados.

Já no final do período, entre 2012 e 2015, o VAT da RMC volta a crescer a taxa de 3,52% ao ano, dando sinais da recuperação dos efeitos negativos da crise. A taxa de crescimento dos anos mais recentes que não constam na série, no entanto, deverá ser impactada negativamente pela crise econômica e política brasileira, que teve seus efeitos mais marcantes a partir de 2014. O PIB nacional sofreu retração de -3,5% em 2015 e em 2016, e cresceu 1% em 2017. A indústria, mais especificamente, sofreu retração de -5,8% em 2015, -4,0% em 2016 e teve crescimento nulo em 2017, de acordos com os dados do IPEA – ver Souza (2018).

Ainda a partir dos dados do Gráfico 1, fica evidente que a RMC se caracteriza, sobretudo, pelas atividades do setor de serviços e da indústria. Esses dois setores, em 2015, responderam conjuntamente por mais de 98% do VAT — serviços – (66,35%) e indústria (32,54%). No que tange a evolução das participações relativas, nota-se que houve mudanças estruturais, marcadas, sobretudo, pelo crescimento expressivo do valor adicionado das atividades de serviços em detrimento das atividades industriais – ver também a Tabela 1.

Em relação ao Estado de São Paulo, apesar de algumas oscilações sobretudo entre 2010-2015, a RMC manteve sua participação no VAT do Estado de São Paulo, como mostram os dados do Gráfico 2.

A partir dos dados apresentados no Gráfico 2, é possível verificar que a participação da RMC no VAT do Estado de São Paulo manteve-se praticamente constante, variando entre 8,10% e 8,27% para os subperíodos selecionados[3]. Destacam-se, ainda, três pontos sobre o VAT relativo.

Primeiro, a participação expressiva do valor adicionado industrial (variando entre 10.75% e 12.16% para os subperíodos analisados) supera a participação relativa do VAT no estado. Este fato reforça o caráter industrial da região, o que tem impactos na dinâmica do emprego, do comércio internacional, entre outros fatores. Por exemplo, a indústria tende a ter rendimentos médio maiores para o trabalho quando comparada a agropecuária e alguns setores de serviços de baixa intensidade de capital e conhecimento. Em relação ao comércio, estima-se que mais de 80% dos bens transacionados globalmente são bens da indústria de transformação – ver Sarti e Hiratuka (2017).

Segundo, destaca-se o decrescimento relativo da indústria da RMC nos anos mais recentes. Tal decrescimento deu-se, sobretudo, pela contração do valor adicionado da indústria da região no período – entre 2010/12 a indústria decresceu a taxa anual média de -14,25%. Este decrescimento, como mencionado, está sendo compensado pelo crescimento da participação dos serviços.

Terceiro, observa-se o aumento da participação da agropecuária no VAT entre 2009/11 e 2012/15, depois de queda expressiva nos anos anteriores. Este aumento deu-se pelo crescimento expressivo do valor adicionado pela agropecuária, mas também pela contração da agropecuária paulista, como evidenciado na Tabela 1.  

A Tabela 1 mostra, ainda, que os serviços cresceram a taxa superior à da indústria durante todo o período, exclusive o subperíodo mais recente (2012/15). No mesmo período, o valor adicionado da indústria deixa de cair e cresce a taxa anuais de 6,70%. Na perspectiva de mais longo prazo, o valor adicionado das atividades de serviço cresce a taxa anual de 4,64% no período 2002/15, enquanto o valor adicionado da indústria cresce a taxa de 2,13%. Por fim, em termos relativos, observa-se que a RMC cresceu a taxas maiores do que o Estado de São Paulo durante todo o período analisado, com exceção do triênio 2010/2012, quando os impactos da crise financeira e econômica internacional assolaram de forma mais intensa a indústria da RMC.

Analiticamente, o crescimento das atividades de serviço levanta algumas questões a serem exploradas, ainda que em estudos futuros. Primeiro, é preciso verificar o quanto que a terceirização pode explicar do aumento relativo dos serviços na composição do VAT.  Este efeito é relevante, visto que a terceirização transforma parte da atividade industrial em serviços, através dos processos de outsourcing de atividades consideradas não fins, pelo menos até 2017. Em 2017, mudanças regulatórias permitiram a ampliação das atividades passíveis de terceirização. A partir disto, espera-se que a participação dos serviços no VAT aumente ainda mais, novamente em detrimento das atividades industriais.

Segundo, é preciso verificar a participação dos serviços industriais no valor adicionado dos serviços, os quais potencialmente melhoram a produtividade da indústria. Serviços mais intensivos em capital ou tecnologia, como segmentos de transporte, telecomunicações, serviços auxiliares financeiros, dentre outros, apresentam níveis de salários e produtividade relativamente mais elevados.  Por outro lado, serviços mais relacionados aos consumidores finais apresentam produtividade e salários comparativamente menores – ver Silva & Menezes (2016) para um estudo a nível nacional. No entanto, com base nos dados investimentos anunciados para RMC entre 1997-2010, acredita-se que as atividades de serviço da RMC sejam compostas por parcela elevada de serviços intensivos em capital ou tecnologia. Deve-se atentar, ainda, para o impacto do crescimento de serviços na capacidade de exportação da RMC. A maior parte dos serviços são não exportáveis (non-tradeables), e como citado acima, o comércio internacional é caracterizado, sobretudo, por trocas de bens produzidos na indústria de transformação.

Por fim, cabe verificar a composição setorial dos municípios da RMC em relação ao VAT, através dos dados da Tabela 2.

A partir da Tabela 2, nota-se que, em 2015, os municípios que mais contribuíram para VAT da RMC foram Campinas (46,33 bilhões), Paulínia (22,23 bilhões), Indaiatuba (9,56 bilhões) e Sumaré (9,43 bilhões). Estas cidades apresentaram valores adicionados elevados nas atividades de serviço e da indústria. Campinas e Sumaré, ainda tiveram produção agropecuária significativa para os padrões regionais, respectivamente, 109,33 e 116,80 milhões de BRL. O município que apresentou maior valor agregado da agropecuária, no entanto, foi Itatiba, que gerou valor agregado no montante de 618 milhões de BRL em 2015, seguido por Holambra que chegou a 238, 33 milhões de BRL. Os dados apontam para considerável heterogeneidade produtiva dos municípios da Região, que devem ser consideradas no desenho das políticas de desenvolvimento regional.

Em síntese, do ponto de vista da estrutura produtiva, a RMC é representativa no Estado de São Paulo, sendo considerada uma região tipicamente industrial, com parcela relevante das atividades de serviço na composição do VAT.

3. Principais Atividades Industriais e Agropecuárias desenvolvidas na Região Metropolitana de Campinas

Nesta seção, explora-se a composição da indústria e da agropecuária a partir da identificação das principais atividades econômicas desenvolvidas no âmbito destes dois setores. Embora importante, a decomposição das atividades do setor de serviços não será feita neste estudo, dada a indisponibilidade de dados de valor adicionado desagregados para os municípios[4]. No entanto, com bases nos investimentos anunciados para os setores de serviços entre 1997-2010, acredita-se que as atividades de transporte aéreo (1,28 bilhões de USD), atividades imobiliárias (2,30 bilhões de USD) e atividades de intermediação financeira (851 milhões de USD) tenha alta representatividade nas atividades de serviço. Destacam-se ainda, em relação aos investimentos anunciados no mesmo período, as atividades de transporte e agenciamento de viagens, captação, tratamento e distribuição de água, saúde e serviços sociais, educação, esporte cultura e lazer, dentre outros. Portanto, acredita-se que parcela relevante dos serviços seja de atividades intensivas em capital e tecnologia.

Em relação à indústria, verifica-se a concentração das atividades em alguns poucos setores de alta, média-alta e média-baixa tecnologia da indústria de transformação, como mostram os dados de valor adicionado fiscal (VAF)[5] da Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda, na Tabela 3.

Os dados mostram que a atividade industrial da RMC se concentrou em praticamente três setores da indústria de transformação no período, sendo eles, produção de combustíveis, material de transporte e produtos químicos, que responderam conjuntamente por mais de 56% do VAF do setor industrial – tomando-se o último ano da série, 2012, como referência.  As dez maiores atividades industriais estão concentradas, sobretudo, em atividades de média-alta e média-baixa tecnologia, o que tem impacto relativo positivo na capacidade de geração de renda no processo produtivo.   

Subdivisões nas classificações da indústria de combustível, atividade de maior participação relativa da RMC, incluem os seguintes grupos:   Coquerias; Fabricação de Produtos Derivados de Petróleo; Elaboração de Combustíveis Nucleares; e Produção de Álcool. Destas atividades, sabe-se a que a RMC se destaca pelas atividades de fabricação de produtos e derivados de petróleo, mais especificamente pelo refino (CNAE-2321-3), a qual teve investimentos anunciados entre 1997-2010 de mais de 2,7 bilhões de USD.

Na produção de Material de Transporte (CNAE -34 e 35), constam as atividades como a fabricação de veículos automotores, fabricação de cabines, carrocerias, reboques e semirreboques, peças e acessórios, dentre outros. No caso da RMC, sabe-se que a presença de algumas montadoras promove intensa atividade dos setores ligados a indústria automobilística, que teve investimentos anunciados entre 1997-2010 de mais de 3 bilhões de USD.

A indústria química (CNAE-24) inclui as subdivisões da fabricação de produtos químicos inorgânicos; fabricação de produtos químicos orgânicos; de fibras, fios, cabos e filamentos contínuos artificias e sintéticos; defensivos agrícolas; sabões, sabonetes e detergentes sintéticos; produtos de limpeza e polimento; tintas, vernizes, esmaltes, lacas e produtos afins; e outros. Os investimentos anunciados entre 1997 e 2010 para esta atividade ultrapassou os 4,34 bilhões de USD.

Por fim, o grupo de produtos farmacêuticos (CNAE-245) inclui a produção de farmoquímicos; medicamentos para o uso humano; medicamentos para uso veterinário; e materiais para usos médicos, hospitalares e odontológicos. Esta atividade teve investimentos anunciados entre 1997-2010 no montante de 896,7 milhões de USD.

Em relação à evolução das principais atividades industriais, nota-se o crescimento do valor adicionado de alguns setores importantes do ponto de vista da intensidade tecnológica, como pode ser visto no Gráfico 3.

A partir do Gráfico 3, verifica-se que não ocorreram grandes mudanças em relação à composição das principais atividades industriais. No entanto, as atividades relacionadas à produção de máquinas e equipamentos, produtos farmacêuticos e materiais de transporte e apresentaram crescimentos reais significativos no período, como ilustrado pelas linhas de tendência no Gráfico 3. A taxa anual de crescimento dos setores foi de: Máquinas e Equipamentos (5,73% a.a.), Produtos Farmacêuticos (5.38% a.a.) e Material de Transporte (4.29% a.a.).  Embora não conste no gráfico, o destaque negativo fica por conta da indústria têxtil, cujo o decrescimento do valor agregado no período se deu à taxa de -2,09% ao ano.

Importante ressaltar que a OCDE considera a indústria têxtil como de baixa intensidade tecnológica. Desta forma, uma primeira análise sobre a expansão das atividades de máquinas e equipamentos, material de transporte e produtos farmacêuticos indicaria a melhora o grau de intensidade tecnológica da indústria regional. Atividades consideradas de maior intensidade tecnológica apresentam maior capacidade na geração de inovações e na capacidade de geração de valor agregado.

A produção agrícola, por sua vez, embora tenha baixa participação no VAT da RMC, não deve ser negligenciada em estudos diagnósticos por uma série de razões. Primeiro, a participação relativa da agropecuária da RMC no Estado de São Paulo, chegou a mais de 5,87% em 2015 – ver Gráfico 2. Segundo, a taxa de crescimento do valor agregado da agropecuária cresceu acima da taxa da indústria durante todo o período, exceto quando se considera o crescimento médio para o período 2002/15, quanto a taxa de crescimento anual do valor adicionado da agropecuária chegou a 15,47% entre os anos de 2012 a 2015 – ver Tabela 1. Terceiro, o desempenho da agropecuária regional tem importantes impactos na disponibilidade local de alimentos e, consequentemente no custo de vida da população, dentre outros fatores sociais, sobretudo ligado a ocupação de pequenos agricultores. O levantamento da Agência Metropolitana de Campinas (AGEMCAMP) a partir de dados do último Censo Agropecuário do IBGE relata que a RMC tem 2443 estabelecimentos de agricultura familiar, o que representa 58,68% do total de propriedades rurais da Região. A agricultura familiar ocupava 19,95 mil hectares, no momento do levantamento[6]

Em relação às principais atividades agropecuárias da região, observa-se forte concentração do valor adicionado na produção de cana-de-açúcar e de frutas, como mostra a Tabela 4.

A cana-de-açúcar respondeu por 42,28% do valor agregado da agropecuária em 2012 (193,75 milhões de reais a preços de 2017), enquanto a participação relativa da laranja foi de 10,30%, da goiaba 9,55% e da uva (9,53%). Sabe-se que Valinhos é considerada a maior produtora brasileira de figo roxo, e, juntamente com os municípios de Vinhedo e Indaiatuba, destaca-se na produção da uva niagara rosada. A RMC tem, ainda, importante representatividade na produção de flores nacionais, embora o valor adicionado da floricultura não seja relativamente elevado em relação ao valor adicionado da agropecuária regional.

Em relação à evolução das principais atividades agrícolas, nota-se que não houve grandes mudanças na composição das principais atividades agropecuárias, como mostra o Gráfico 4, que mostra a evolução dos valores agregados médios para os períodos selecionados.

Os dados mostram, no entanto, crescimento expressivo do valor agregado fiscal do plantio de cana-de-açúcar (7,06% a.a.), da goiaba (12,43% a.a.) e mandioca (16,48% a.a.). O valor agregado pela produção de laranja disparou no triênio de 2006/08, mas com base no valor dos demais períodos, o crescimento foi conjuntural.

Em síntese, a partir da composição das atividades industriais desenvolvidas na RMC pode-se afirmar que a indústria regional tem considerável participação de atividades de alta e média intensidade tecnológica. As atividades de serviço, caso sejam representadas pelos investimentos anunciados, são sobretudo, atividades intensivas em capital e conhecimento. Dentre as atividades agrícolas, no entanto, observa-se que a cana-de-açúcar tem participação expressiva. A produção desta cultura é geralmente associada com impactos sociais e ambientais consideráveis, que devem ser acompanhados em estudos futuros. Por outro lado, a produção pode ser considerada como mais sofisticada, já que se concentra em culturas de maior valor agregado. 

4. Comércio Exterior na Região Metropolitana de Campinas

Nesta seção, busca-se caracterizar a estrutura de comércio exterior da RMC, a partir dos dados da balança comercial das duas últimas décadas, da análise da pauta de exportação e importação e da identificação dos principais parceiros comerciais. Além disso, apresenta-se a balança comercial dos municípios, a fim de explorar, de forma preliminar, a heterogeneidade municipal no que tange às relações externas. A análise da evolução dos fluxos de produtos específicos durante o período será feita em outro Estudo Temático a ser publicado pelo Observatório da PUC-Campinas. O Gráfico 5 apresenta os dados da balança comercial da RMC para os anos entre 1997 e 2017.

Nota-se, de forma clara, que a balança comercial da RMC apresentou saldos negativos durante todo o período, indicando que tal resultado tem caráter estrutural. As importações que já totalizavam 3,47 bilhões de dólares em 1997, cresceram a taxas expressivas (6,60%), chegando a 11,69 bilhões de dólares, em 2017. No mesmo período as exportações que chegaram a 1,57 bilhões de dólares em 1997, e 4,5 bilhões em 2017, cresceram a taxas menores (5,26%). Estes dois fatos combinados, potencializaram o crescimento dos déficits, que cresceu a taxa de 7,48% a.a., chegando a 7,64 bilhões de dólares em 2017.

No entanto, é importante considerar que o déficit comercial cresceu de forma mais acentuada nos na última década (2007-2017), quando a taxa de crescimento anual foi de 10,26%.  Neste mesmo período, as exportações decrescem a taxa de -3.33% a.a. e as importações crescem 3.39% a.a. Quando se considera que esse período é subsequente ao período de vultosos investimentos anunciados para RMC, de acordo com os relatórios da Fundação SEADE, levanta-se questões a respeito do impacto dos investimentos industriais na RMC na balança comercial. Alguns estudos apontam para o forte viés importador e baixo viés exportador do Investimento Externo Direto no Brasil (IDE). Isto se dá, pois, o principal determinante do IDE industrial seria o tamanho do mercado interno, e a estrutura produtiva local não é capaz de suprir a demanda de alguns insumos chaves por parte das multinacionais. Um exemplo ilustrativo é o caso da produção de pneus na RMC, que gera demanda por importações de borracha e vende boa parte do produto no mercado interno. Operadores do setor alegam que boa parte da borracha produzida no Brasil não tem qualidade técnica para produção de pneus de primeira linha.

A participação da RMC na balança comercial do Estado de São Paulo, neste sentido, destaca-se pelo peso que Região tem nos déficits do estado, como mostra a Tabela 5.

Os dados de importação, exportação e saldo, para os períodos selecionados, evidenciam que a RMC teve crescente participação no aumento das importações relativas do estado, chegando a 21,4% no ano de 2017. Por outro lado, as exportações relativas fecharam o período 8%. A contribuição para o saldo deve ser analisada em três situações, considerando-se que a RMC tem déficit durante todo o período, mas o Estado de São Paulo teve superávit em 2007. Em 1997, quando a balança comercial do estado tem saldo negativo, a RMC respondeu por 18.59% do déficit total paulista. Em 2007, quando o saldo da balança comercial do estado foi positivo, a RMC evitou que o superávit fosse 95,66% maior do que o observado. Já em 2017, quando o saldo da balança comercial do estado é negativo novamente (4,63 bilhões), o Estado teria saldo positivo caso o déficit da balança comercial da RMC (7,64 bilhões) não tivesse ocorrido. Isso mostra, inclusive, o quanto a RMC depende de superávits gerados em outros setores e regiões do País para manter sua atividade industrial.

A perspectiva de evolução da participação negativa no déficit da balança comercial de São Paulo, para todos os anos entre 1997-2017 confirmam o crescimento da participação da RMC nas importações, e portanto, nos déficits – ver Gráfico 6.

Em relação à pauta de exportação, nota-se que a mesma é bastante diversificada, mas os principais produtos em relação ao volume de comércio são automóveis de passageiros e outros veículos, medicamentos, polímeros de propilenos e outras olefinas, partes e acessórios de veículos e pneumáticos. Estes produtos responderam por 30.83% do valor exportado da RMC em 2017 – isto é, 1,24 bilhões de dólares. Em relação aos produtos importados, a pauta é mais concentrada, incluindo principalmente aparelhos elétricos para telefonia, circuitos integrados, inseticidas, rodenticidas, fungicidas e outros, e partes e acessórios de veículos. A importação destes produtos em conjunto, respondeu por mais de 35% das importações em 2017 – isto é, mais de 4,16 bilhões de dólares.  Verifica-se, portanto, que tanto a pauta de exportação quanto a pauta de importação são compostas, sobretudo, de produtos da indústria de transformação. Esta característica é desejável e é substancialmente diferente do observado para a pauta de exportação brasileira, composta sobretudo de commodities agrícolas. No entanto, não se pode deixar de observar que a pauta de importação inclui alguns insumos básicos utilizados na produção industrial dos principais atividades da RMC.

Em relação aos parceiros comerciais, cabe notar que as exportações são direcionadas, sobretudo, para Argentina (27,12%) e para o os Estados Unidos (13,0%). Os demais países incluem outros países da América do Sul, México e Alemanha. Já as importações são oriundas, principalmente, da China (23.98%) e dos Estados Unidos (15,01%). As demais origens incluem Alemanha, Japão, Coreia do Sul, dentre outros países com atividades alta produtividade da indústria, que se refletem em elevada competitividade externa.  

Esse padrão de comércio levanta duas questões importantes. Ter insumos básicos para produção regional dentre os principais produtos importados, revela a alta dependência das importações que podem significar menor espaço para agregação de valor das atividades industriais desenvolvidas na região.  Segundo, enquanto as importações são provenientes de países de alta eficiência na produção industrial, boa parte das exportações é destinada a países de menor eficiência na produção industrial. Este padrão pode ser um reflexo da baixa competitividade externa da indústria regional, que não possui competitividade suficiente para obter parcelas relevantes de mercados mais sofisticados. A falta de encadeamentos com a indústria nacional no suprimento de insumos básicos, explica, inclusive o padrão deficitário da balança comercial.

Alguns estudos focados nos efeitos positivos associados a condição de exportador das firmas, preveem que ao acesso a mercados internacionais podem aumentar as capacidades de inovação e a eficiência produtiva, através de efeitos ditos “pós-entrada” – ver Serti e Tomasi (2008). No entanto, estes efeitos de retroalimentação na competitividade externa serão mais evidentes quando as firmas têm acesso a mercados mais sofisticados em relação as exigências tecnológicas, de produtividade e qualidade.

Em síntese, do ponto de vista da estrutura de comércio exterior, a RMC caracteriza-se por desempenho exportador aquém do seu desempenho importador, o que gera volumosos déficits na balança comercial regional, e agrava o saldo da balança comercial do Estado de São Paulo.

5. Considerações Finais

Este estudo temático buscou caracterizar a estrutura produtiva e de comércio exterior da Região Metropolitana de Campinas, bem como sua evolução na história recente. Do ponto de vista da estrutura produtiva, nota-se que a RMC tem importância considerável na dinâmica produtiva do Estado de São Paulo, caracterizada sobretudo pela intensa produção industrial e do setor de serviços. A indústria é composta por atividades de alta e média intensidade tecnológica, e as atividades de serviço, ao que tudo indica, são principalmente atividades intensivas em capital e tecnologia. Do ponto de vista da estrutura de comércio, chamam atenção os elevados e crescentes déficits da balança comercial verificados entre os anos de 1997 e 2017.

Do ponto de vista analítico, destaca-se a crescente participação do valor adicionado dos serviços no VAT. O setor tem crescido a taxas superiores à da indústria, o que demanda investigação mais detalhada da composição do setor de serviços e dos impactos dessa mudança na atividade produtiva da RMC. O padrão de comércio indica alta dependência externa de insumos-chave para produção industrial e baixa competitividade externa da indústria local. Essa realidade não específica da RMC, de forma que outras regiões industrializadas do país apresentam padrões de comércio similares.

Os pontos levantados demandam atenção dos especialistas e, sobretudo, dos formuladores de políticas que precisam considerar as fragilidades e potencialidades da RMC enfrentar os desafios do desenvolvimento socioeconômico da região. Num primeiro momento, aponta-se que essas políticas devam atuar no sentido de promover o aumento da competividade externa da RMC, ao pensar políticas industriais que possam reduzir algumas das fragilidades e reforçar algumas das potencialidades identificadas neste estudo. Importante dizer que este Estudo Temático não exaure a discussão necessária sobre a estrutura de produção e de comércio exterior da RMC. Outros estudos serão necessários para entender os principais gargalos ao desenvolvimento regional, sobretudo estudos que avancem no entendimento do ambiente microeconômico que as empresas operam.

  • Referências

AGEMCAMP.  Observatório Metropolitano de indicadores da RMC (2018). Disponível em: http://www.agemcamp.sp.gov.br/produtos/indicadores/pesquisa. Acesso em: 06/05/2018

IBGE. ESTADIC – Pesquisa de Informações Básicas Estaduais (2012). Disponível em: ftp://ftp.ibge.gov.br/Perfil_Estados/2012/estadic2012.pdf – 2012. Acesso em: 06/05/2018

SEADE (2006). Investimentos Anunciados na Região Metropolitana de Campinas 1997-2005. Junho, 2006. Disponível em: http://www.agemcamp.sp.gov.br/midia/investimentos.pdf

SEADE (2013). Investimentos Anunciados na Região Metropolitana de Campinas 2006-2010. Maio, 2013. Disponível em: http://www.agemcamp.sp.gov.br/midia/Piesp_RMC_2006_a_2010_Analise.pdf

SEADE. Perfil dos municípios paulistas (2018). Disponível em: http://www.perfil.seade.gov.br. Acesso em: 14/04/2018.

SARTI, F. & HIRATUKA, C. (2017). Desempenho recente da indústria brasileira no contexto de mudanças estruturais domésticas e globais. Texto para discussão, n.290. Instituto de Economia da Unicamp.

SILVA, M. C. & MENEZES, F. A. N. (2016). Uma Abordagem sobre o Setor de Serviços na Economia Brasileira. Policy Paper n.19, agosto, 2016. Insper- Centro de Políticas Públicas.

SERTI, F. & TOMASI, C. (2008). Self-selection and post-entry effects of exports: Evidence from italian manufacturing firms. Review of World Economics, n.4, v. 144.

SOUZA, J. R. J. (2018). Carta de Conjuntura n. 39 – 2o semestre de 2018: Crescimento desacelera no início do ano, mas retomada continua. IPEA, Maio, 2018.

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) – Base de dados do Comércio Exterior Brasileiro. Acesso em maio/2018.


[1] Como explicitado na introdução, a amplitude longitudinal do trabalho limita-se a disponibilidade de dados oficiais. A série do VAF contempla os anos de 2000 a 2002, enquanto a série do VAT contempla os anos de 2002 a 2015. Dado o foco em fatores estruturais, a análise não sofre grandes prejuízos associados a esta limitação.

[2] Valores deflacionados pelo deflator implícito utilizado pelo SEADE, para os preços de 2015.

[3] O cálculo de participações médias trianual e quadrianual para o último período visa reduzir o impacto de fatores conjunturais na série.

[4] O observatório a PUC-Campinas tem desenvolvido estudos sobre o emprego no setor de serviços da RMC. Neste sentido, análises sobre este setor devem ser publicadas em breve.

[5] A Sefaz/SP disponibiliza, via Fundação Seade, série histórica compreendendo os anos entre 2000 e 2012.

[6] Ver “RMC: Agricultura Familiar”, disponível no site do Observatório Metropolitano de Indicadores da RMC.


Prof. Dr. Paulo Ricardo da Silva Oliveira

Graduado em Ciências Econômicas e Administração com Ênfase em Comércio Exterior pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), mestre e doutor em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Sou professor extensionistas da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), onde desenvolvo um projeto de desenvolvimento e acompanhamento de indicadores da produção industrial, agrícola e da inserção internacional da Região Metropolitana de Campinas (RMC). Paralelamente, desenvolvo pesquisas nas áreas de economia internacional e industrial, mais especificamente em temas ligados aos impactos da inovação tecnológica e da regulação nos fluxos internacionais de comércio. (Fonte: Currículo Lattes)


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